O garimpo de ouro, diferente da mineração, ocorre pela extração de minerais em pequeno volume e distribuição irregular, sem o uso de explosivos e, legalmente, fora de terras indígenas.
Pode ocorrer dentro de rios ou em terra firme, desde que o material esteja em contato com a água, e baseia-se em retirar a lama do solo com uma draga e separar o ouro dos outros materiais, como cascalho e areia.
Para essa separação utiliza-se o mercúrio, que age como uma espécie de imã do ouro, gerando uma liga visível que possibilita a seleção e separação. Após a formação da liga, a pedra formada é queimada e o mercúrio é evaporado, restando apenas o ouro. A água contaminada com excesso de mercúrio retorna ao corpo d’água.
As regiões com maiores quantidades de jazidas de ouro no Brasil estão localizadas na região Norte, destacando-se o vale do Rio Tapajós (Pará), Rio Tocantins (Tocantins) e vale do Rio Madeira (Rondônia).
Em outubro de 2020 foi apresentada no Ministério Público do Estado do Pará uma pesquisa realizada pela Fiocruz, em parceria com o WWF-Brasil, referente a localidade do médio Rio Tapajós, que identificou, por meio de amostras de cabelo, a contaminação por mercúrio de 100% dos indígenas Munduruku de três Aldeias da Terra Indígena Sawré Muybu. Cerca de 57,9% dos 200 participantes, incluindo crianças, adultos e idosos, apresentaram níveis de mercúrio acima do limite máximo de segurança estabelecido pela Organização Mundial da Saúde – OMS.
Também foram analisados 88 exemplares de peixe, de 18 espécies distintas, e todos obtiveram resultados positivos para contaminação por mercúrio, sendo que as espécies piscívoras, que se alimentam de outros peixes, apresentaram maior concentração do contaminante. Ademais, a partir de entrevistas, a pesquisa verificou que 98% dos participantes ingerem peixes regularmente, indicando que a contaminação se da principalmente pelo consumo de peixe.
Dentre os sintomas da contaminação por mercúrio está a irritabilidade, dores de cabeça, dificuldade de deglutição, distúrbios sensoriais nas mãos e pés, danos à audição, entre outros. Das aldeias às margens dos rios afetados, aproximadamente 16% das crianças menores de 5 anos apresentaram problemas de coordenação motora e na fala, quando submetidas a testes de neurodesenvolvimento.
Entretanto, como o levantamento anterior foi realizado em um determinado momento no tempo, e não durante um período, não foi possível afirmar que os danos à saúde estejam associados à exposição crônica ao mercúrio. Dessa forma, em continuidade a pesquisa inicial, a Fiocruz iniciou na semana do dia 09 de outubro de 2023 um estudo com as gestantes e bebês Munduruku, com o objetivo de avaliar os efeitos relacionados ao neurodesenvolvimento das crianças em consequência a exposição ao mercúrio.
O estudo irá acompanhar as gestantes convidadas e seus bebês por 24 meses, avaliando os níveis de exposição ao mercúrio em três momentos distintos até o parto e monitoramento do bebê por um determinado período após o nascimento.
Além dessas Aldeias, também foi confirmada a contaminação por mercúrio em indígenas das regiões da Terra Indígena Yanomami, em Roraima e Amazonas – estudo realizado pela Polícia Federal em fevereiro de 2023.
Foto: Polícia Federal/Reprodução.
Em relação ao garimpo ilegal, que além da contaminação dos corpos d’água é responsável por inúmeros casos de violação de direitos humanos, invasão de terras indígenas, desmatamento, dentre outros crimes, o Ministério Público Federal emitiu neste ano algumas recomendações e questionamentos ao Ministério da Saúde, Ibama e Agência Nacional de Mineração, que visam a redução dos garimpos ilegais e contaminações por mercúrio nos rios afetados.
O garimpo ilegal é um problema histórico do país e exige uma abordagem holística para ser combativo, protegendo não apenas os ecossistemas, mas também os direitos humanos e culturais dos povos indígenas afetados.
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